O Dr. Rodrigo Costa Nina, Juiz da Comarca de Santa Luzia do Paruá, deferiu o pedido do Ministério Público (MP), através do Promotor Hagamenon de Jesus Azevedo, afastando do cargo prefeito municipal de Nova Olinda do Maranhão, o senhor Delmar Barros da Silveira Sobrinho (DEM).
A decisão foi divulgada nesta quarta-feira (16). Vale ressaltar que a decisão cabe recurso.
De acordo a decisão do magistrado serão oficiados o Comandante da Polícia Militar da Companhia de Zé Doca, Destacamento da PM de Nova Olinda do Maranhão e o presidente da Câmara Municipal de Nova Olinda, vereador José Alberto Lopes Sousa, que após tomar ciência da decisão, convocará o legislativo em sessão extraordinária para empossar o vice-prefeito Marlon Vale Cutrim nas próximas 24 horas.
O Jornal Eletrônico traz abaixo a decisão do magistrado.
Confira a decisão do magistrado na íntegra.
D E C I S Ã O
Vistos
etc.,
Tratam os autos de Ação Civil Pública por Ato de
Improbidade, com pedido cautelar de afastamento da função pública, proposta
pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL em desfavor de DELMAR BARROS DA
SILVEIRA SOBRINHO, prefeito do Município de Nova Olinda do Maranhão/MA, em
razão da prática reiterada de atos que afrontam os princípios da administração
pública, previsto no art. 11 da Lei nº. 8.429/92.
Sustenta o requerente que o Chefe do Poder Executivo desde
o ano de 2013 tem atrasado reiteradamente os salários do funcionalismo público,
sejam servidores efetivos, sejam contratados temporariamente, gerando enormes
prejuízos à comunidade de Nova Olinda do Maranhão/MA, pois os servidores
dependem de seus proventos para garantir as necessidades básicas, tais como
alimentação, assistência médica, moradia, vestuário etc., assim como o comércio
local depende dos valores para sua sustentabilidade.
Tal ato estaria revelando "grave ineficiência
funcional e desídia no trato da coisa pública", levando o ajuizamento
de diversas ações no Poder Judiciário, bem como a busca incessante e
diariamente a atendimento na sede do ministério pública para busca da solução
do conflito, por parte dos servidores públicos.
Assim, destacada que o ato omissivo em não pagar
reiteradamente o salário dos servidores públicos, sem qualquer justificativa,
demonstra que o Prefeito Municipal tem atentado contra os princípios da
administração pública relativos à legalidade, moralidade, motivação e probidade
administrativa, em especial por não haver notícia de que os repasses dos fundos
municipais não estariam sendo realizados, de modo que revela a aplicação das
verbas para outra destinação.
Com esses fundamentos, requer a condenação do gestor
público pela prática de ato de improbidade administrativa, na sanção prevista
no art. 12, III, da Lei 8.429/92.
Em sede de pedido cautelar, requer o Ministério Público o
afastamento do prefeito da função pública, na forma do art. 20, parágrafo
único, da Lei 8.429/92, em razão de que permanecendo à frente da administração
pública continuará a causar prejuízos com a reiteração dos atos omissos, bem
como prejudicará a instrução criminal, intimidando os servidores e membros do
sindicato que buscam denunciar os atrasos no pagamento, a exemplo das
transferências imotivadas e perseguições.
Com a inicial juntou os documentos de fls. 14 a 291.
Às fls. 293/298 o Ministério Público reitera o pedido
cautelar de afastamento do cargo, juntando documentos de sua atuação como
gestor, e que prejudica a instrução processual.
É o necessário relatar, ao que passo ao exame do pedido
cautelar de afastamento das funções públicas.
As tutelas de urgência, no direito brasileiro, se
distinguem em duas espécies: a tutela antecipada e a tutela cautelar.
Ambas não se confundem e possuem natureza jurídica
distintas em razão do objetivo almejado. Na primeira, ou seja, na tutela
antecipada, estamos verdadeiramente antecipando um provimento judicial que
seria posto no mundo concreto, na vida em sociedade, somente com o trânsito em
julgado de uma sentença de mérito, desde que preenchidos critérios objetivos
rígidos. A outra tutela de urgência não tem essa finalidade, ela visa assegurar
o resultado prático de uma sentença a ser proferida ao final do processo. Não
corresponde em si ao direito material perquirido, mas sim o meio de se buscar
de forma segura o direito concreto a ser declarado ou constituído pelo Poder
Judiciário.
Portanto, o escopo da tutela cautelar não é satisfazer a
pretensão, mas sim viabilizar a sua satisfação, blindando-a dos obstáculos que
poderia se sujeitar a solução do processo.
A natureza desta última é, por conseguinte, meramente
assecuratória e, destarte, possui requisitos menos profundos para sua concessão
do que a tutela antecipada, mas não menos circunspectos, limitando o magistrado
à verificação do fumus boni iuris e do periculum in mora.
Pois bem.
No caso vertente o pedido do processo manejado pelo
Ministério Público tem por núcleo a condenação do Prefeito Municipal nas
sanções previstas para a prática de ato de improbidade administrativa que
atentam contra os princípios da administração pública, concernentes a
legalidade, moralidade, motivação e probidade administrativa.
Para isso, em sede de tutela cautelar, requer a concessão
de liminar para afastamento do cargo o Prefeito Municipal responsável pelos
atos omissivos que reputa ímprobo, como supedâneo de garantia da instrução
processual sem interferência do império do poder que exerce sobre o
funcionalismo público, seja através da reiteração dolosa da omissão, seja na
intimidação antecedente à colheita da prova testemunhal, trazendo, com isso, a
verdade real ao processo de forma intacta.
Dispõe a Lei 8.429/92, parágrafo único:
Art.
20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se
efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Parágrafo único. A autoridade
judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente
público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração,
quando a medida se fizer necessária à instrução processual.
Não há dúvidas, portanto, da possibilidade de afastamento
do gestor público, mesmo alçado ao cargo por meio do voto popular, pois
decisões desse jaez não ameaçam ou violam o princípio constitucional da
separação dos poderes. Ao Poder Judiciário compete o controle da legalidade dos
atos praticados pelos outros poderes, função lhe confiada em um Estado Democrático de Direito.
Assim, para deferimento do pedido de afastamento dois
requisitos devem estar sobejamente comprovados: o fumus boni iuris
e o periculum in mora.
Segundo Luiz Rodrigues Wambier: "O provimento
cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de
ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado
(periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a
necessidade da tutela cautelar e a inexorabilidade de sua concessão, para que
se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de
efeitos concretos do provimento jurisdicional principal".
Para o referido autor, "O fumus boni iuris
significa a plausibilidade do direito alegado pela parte, isto é, a existência
de uma pretensão que é provável, sendo possível ao juiz aferir esse determinado
grau de probabilidade pela prova sumária carreada aos autos pelo autor do
pedido cautelar".
E "O periculum in mora estará presente sempre que
se verificar risco de que a demora do provimento jurisdicional definitivo, que aplicará
o direito ao caso concreto submetido ao conhecimento do Poder Judiciário, seja
danosa a esse mesmo resultado, na medida em que possa causar dano à efetividade
do processo principal. Esse dano à efetividade do processo está ligado a outro
dano, de natureza concreta, que pode ser, por exemplo, o perecimento do objeto
da controvérsia.
Em conclusão às suas lições, arremata: "Presentes
esses dois requisitos, isto é, sendo provável o direito alegado e estando o
mesmo sob ameaça, porque não é possível sua preservação até que o Poder
Judiciário se pronuncie definitivamente naquele processo, está aberta a
possibilidade do manejo da tutela cautelar.".
E esse, pois, é o caso em apreço.
Destaca-se, também, que para a análise do pedido cautelar inaudita
altera pars é imprescindível que estejam sobejamente comprovados os
requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora,
sustentados, respectivamente, na relevância do fundamento invocado e na
possibilidade de ocorrência de prejuízo irreparável ao erário público caso seja
a ordem concedida somente ao final, ou após a oitiva previa da parte ex-adversa,
pois, apesar da necessidade do contraditório em todo processo, há situações
peculiares de urgência que não podem esperar, sob pena de se tornarem inócuas
as medidas adotadas.
Assim, para evitar que um provimento tardio torne inútil
ou insustentável o direito pleiteado, deve-se analisar o caso concreto para
concessão da tutela inaudita altera pars.
E do cotejo dos documentos que instruem o presente feito
vimos com clareza solar a existência do fumus boni iuris e periculum
in mora para conceder a tutela cautelar de afastamento da função pública,
antes da notificação para defesa preliminar.
Saltam aos olhos 02 (dois) processos de cobrança de verbas
salariais atrasadas (proc. 492-57.2015.8.10.0116 e 1447-88.2015.8.10.0116) onde
se vê, de maneira inconteste, a fumaça do bom direito, pois não obstante
a existência de vínculo obrigacional entre o município e seu quadro funcional,
assim como a respectiva prestação de serviços à pessoa jurídica de direito
público interno, os servidores públicos não vêm recebendo a necessária
contrapartida em forma de remuneração, ato que deveria ter praticado de ofício
e tal omissão, em tese, caracteriza ato de improbidade que lesionaria os princípios
da legalidade, moralidade e probidade administrativa.
A esses dois processos soma-se outro extinto sem resolução
de mérito, distribuído nos idos de 2013, onde houve a declaração da perda
superveniente do interesse processual em razão da atualização, nos primeiros
meses do ano de 2014, dos salários atrasados, demonstrando, pois, com a
distribuição das duas ações suso mencionadas, por parte do Ministério Público,
e diversas outras em que figuram duplas de servidores no polo ativo, por meio
de advogados constituídos, que é plausível o direito invocado para concessão de
tutela cautelar, qual seja, de que esteja o gestor, por omissão, cometendo
improbidade administrativa, quer por violação a princípios norteadores da
administração pública, que por danos ao erário, porquanto, várias das ações
resultaram em ressarcimento por danos morais, além do pagamento de salários
corrigidos.
No que tange ao periculum in mora não há dúvidas
que as reiterações dessas condutas administrativas ao bel-prazer do gestor
causam transtornos aos servidores do Município de Nova Olinda do Maranhão/MA,
tanto que nos processos principais (para recebimento de verbas salariais) foram
concedidas tutelas antecipadas para efetivação de bloqueio de recursos oriundos
do FPM, FUNDEB, dentre outros, como garantia do pagamento, o que demonstra que,
se se mantiver no cargo de Prefeito, continuará a gerir as verbas públicas à
sua conveniência omissiva, embora haja destinação específica em percentuais
para pagamento de salário. Isso seria renovar, como ocorreu em 2014/2015, e
perpetuar os supostos atos de improbidade administrativa acaso necessário
esperar o final do processo para o Poder Judiciário declarar a perda da função
pública, em sendo julgado procedente o pedido.
Ressalte-se, também, que quanto ao periculum in mora
específico, trazido pelo parágrafo único do art. 20 da Lei de Improbidade
Administrativa, qual seja a de que a medida de afastamento contenha o caráter
de imprescindibilidade para instrução processual, os documentos de fls. 290/291
e 295/296 revelam a medida exata da pertinência da tutela cautelar.
Tais documentos evidenciam, em tese, perseguições
políticas e/ou punições a ANTONIO DE JESUS RIBEIRO e GEYBSON DE ALMEIDA
FERREIRA em razão das notícias levadas ao Ministério Público e pedido de
providências, de modo que transferências sem motivação, comunicadas
verbalmente, violam o princípio da motivação dos atos administrativos e revelam
o desejo pessoal do gestor em detrimento da indispensabilidade dos motivos dos
atos discricionários em razão do agir por oportunidade e conveniência do agente
público.
Outra noção não pode ter o Poder Judiciário senão a de que
tais atos têm sido praticados como meio coercitivo, punitivo dos servidores que
denunciaram os fatos e que, inequivocamente, pode contaminar a verdade a ser
sedimentada no processo, por meio da instrução, pois inibirá que o servidor
colabore com o aclaramento da verdade. Sobre ele possui o Prefeito hierarquia
funcional e lhe é consciente o temor da represália se algo restar comprovado e
prejudicar o Chefe do Poder Executivo, tanto o é que sentiu in concreto
tal efeito com a mera comunicação do fato ao Ministério Público, quiçá, se
houver provimento judicial condenatório.
Nesse sentido, vislumbra-se claramente a possibilidade de
ocorrência de lesão de difícil reparação, quiçá irreparável, ao direito do
Estado em punir atos de improbidade administrativa, se a prova oral vier
contaminada pelo vício de vontade da coação.
Importante destacar que outras provas, a exemplo de documentos
relativos à destinação das verbas públicas que deveria ser para o pagamento de
salários dos servidores públicos, tais como recibos de pagamento de
fornecedores, notas de empenho, contratos de obras e/ou serviços, que se
encontram em poder do gestor, enquanto guardião-mor dos documentos
administrativos da Prefeitura Municipal, se tornaram de difícil obtenção,
talvez, perecidas.
Por fim, merece destaque que o afastamento das funções não
traduz descontinuidade administrativa municipal, porquanto assume o cargo o
sucessor legal, in casu, o vice-prefeito, não trazendo prejuízos aos
munícipes, nem aos servidores públicos e muito menos aos serviços essenciais.
Ao revés, deve o gestor interino engendrar esforços para atualização dos
salários dos servidores, sob pena de cometer atos de improbidade
administrativa.
O Superior Tribunal de Justiça##
"(...)
O afastamento temporário de prefeito municipal, com base no art. 20, parágrafo
único, da Lei n. 8.249/1992 e decorrente de investigação por atos de
improbidade administrativa não tem o potencial de, por si, causar grave lesão
aos bens jurídicos protegidos pela Lei n. 8.437/1992. Agravo regimental
desprovido"
ASSIM SENDO,
constatando a presença dos requisitos necessários, consistentes no periculum
in mora e fumus boni iuris, e com fundamento no art. 20, parágrafo único,
da Lei 8.429/92, DEFIRO o pedido de tutela cautelar para afastar
DELMAR BARROS DA SILVEIRA SOBRINHO da função de PREFEITO MUNICIPAL de Nova
Olinda do Maranhão/MA, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias##
, lapso temporal que reputo suficiente à instrução da Ação
de Improbidade Administrativa em razão de atos que violam princípios da
administração pública e causam dano ao erário, salvo se concluída em menor
tempo, sem prejuízo de sua remuneração mensal.
Diante da presente decisão, deverá ainda o requerido
manter-se afastado da sede da prefeitura municipal em pelo menos 500m
(quinhentos metros), assim como da Secretaria de Educação, Saúde, Administração
e Tesouraria, se funcionarem em prédios distintos, sob pena de prisão em
flagrante por crime de desobediência, previsto no art. 330 do Código Penal.
Oficie-se ao Comando da 12ª Companhia Independente da
Polícia Militar do Maranhão, com sede na cidade de Zé Doca/MA, bem como ao
destacamento da cidade de Nova Olinda do Maranhão/MA, para ciência da decisão e
atuação imediata em caso de descumprimento, por caracterizar crime previsto no
código Penal.
Oficie-se ao Banco do Brasil S/A acerca da presente
decisão, dando-lhe ciência do afastamento do requerido do cargo de Prefeito, o
que lhe impede de movimentar as contas de titularidade do município de Nova Olinda
do Maranhão/MA.
Notifique-se à Câmara Municipal de Nova Olinda do
Maranhão, por seu presidente, para que, em sessão extraordinária, dê posse ao
vice-prefeito, no cargo de prefeito, como corolário da decisão de afastamento
do requerido, no prazo de 24 horas, haja vista a impossibilidade de acefalia do
Poder Executivo.
Notifique-se o requerido para apresentar manifestação por
escrito, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 17, § 7º da 8.429/92.
Intimem-se o requerido e o Ministério Público da presente
decisão.
Cumpra-se.
Santa Luzia do Paruá/MA, 16 de dezembro de 2015.
RODRIGO COSTA NINA
Juiz de Direito
Fonte:MP e TJ Maranhão.
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