quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Justiça defere afastamento do gestor de Nova Olinda do Maranhão por 180 dias.

O Dr. Rodrigo Costa Nina, Juiz da Comarca de Santa Luzia do Paruá, deferiu o pedido do Ministério Público (MP), através do Promotor Hagamenon de Jesus Azevedo, afastando do cargo prefeito municipal de Nova Olinda do Maranhão, o senhor Delmar Barros da Silveira Sobrinho (DEM).
A decisão foi divulgada nesta quarta-feira (16).  Vale ressaltar que a decisão cabe recurso.
De acordo a decisão do magistrado serão oficiados o Comandante da Polícia Militar da Companhia de Zé Doca, Destacamento da PM de Nova Olinda do Maranhão e o presidente da Câmara Municipal de Nova Olinda, vereador José Alberto Lopes Sousa, que após tomar ciência da decisão, convocará o legislativo em sessão extraordinária para empossar o vice-prefeito Marlon Vale Cutrim nas próximas 24 horas.

O Jornal Eletrônico traz abaixo a decisão do magistrado.

Confira a decisão do magistrado na íntegra.

D E C I S Ã O

Vistos etc.,

Tratam os autos de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade, com pedido cautelar de afastamento da função pública, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL em desfavor de DELMAR BARROS DA SILVEIRA SOBRINHO, prefeito do Município de Nova Olinda do Maranhão/MA, em razão da prática reiterada de atos que afrontam os princípios da administração pública, previsto no art. 11 da Lei nº. 8.429/92.
Sustenta o requerente que o Chefe do Poder Executivo desde o ano de 2013 tem atrasado reiteradamente os salários do funcionalismo público, sejam servidores efetivos, sejam contratados temporariamente, gerando enormes prejuízos à comunidade de Nova Olinda do Maranhão/MA, pois os servidores dependem de seus proventos para garantir as necessidades básicas, tais como alimentação, assistência médica, moradia, vestuário etc., assim como o comércio local depende dos valores para sua sustentabilidade.
Tal ato estaria revelando "grave ineficiência funcional e desídia no trato da coisa pública", levando o ajuizamento de diversas ações no Poder Judiciário, bem como a busca incessante e diariamente a atendimento na sede do ministério pública para busca da solução do conflito, por parte dos servidores públicos.
Assim, destacada que o ato omissivo em não pagar reiteradamente o salário dos servidores públicos, sem qualquer justificativa, demonstra que o Prefeito Municipal tem atentado contra os princípios da administração pública relativos à legalidade, moralidade, motivação e probidade administrativa, em especial por não haver notícia de que os repasses dos fundos municipais não estariam sendo realizados, de modo que revela a aplicação das verbas para outra destinação.
Com esses fundamentos, requer a condenação do gestor público pela prática de ato de improbidade administrativa, na sanção prevista no art. 12, III, da Lei 8.429/92.
Em sede de pedido cautelar, requer o Ministério Público o afastamento do prefeito da função pública, na forma do art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/92, em razão de que permanecendo à frente da administração pública continuará a causar prejuízos com a reiteração dos atos omissos, bem como prejudicará a instrução criminal, intimidando os servidores e membros do sindicato que buscam denunciar os atrasos no pagamento, a exemplo das transferências imotivadas e perseguições.
Com a inicial juntou os documentos de fls. 14 a 291.
Às fls. 293/298 o Ministério Público reitera o pedido cautelar de afastamento do cargo, juntando documentos de sua atuação como gestor, e que prejudica a instrução processual.
É o necessário relatar, ao que passo ao exame do pedido cautelar de afastamento das funções públicas.
As tutelas de urgência, no direito brasileiro, se distinguem em duas espécies: a tutela antecipada e a tutela cautelar.
Ambas não se confundem e possuem natureza jurídica distintas em razão do objetivo almejado. Na primeira, ou seja, na tutela antecipada, estamos verdadeiramente antecipando um provimento judicial que seria posto no mundo concreto, na vida em sociedade, somente com o trânsito em julgado de uma sentença de mérito, desde que preenchidos critérios objetivos rígidos. A outra tutela de urgência não tem essa finalidade, ela visa assegurar o resultado prático de uma sentença a ser proferida ao final do processo. Não corresponde em si ao direito material perquirido, mas sim o meio de se buscar de forma segura o direito concreto a ser declarado ou constituído pelo Poder Judiciário.
Portanto, o escopo da tutela cautelar não é satisfazer a pretensão, mas sim viabilizar a sua satisfação, blindando-a dos obstáculos que poderia se sujeitar a solução do processo.
A natureza desta última é, por conseguinte, meramente assecuratória e, destarte, possui requisitos menos profundos para sua concessão do que a tutela antecipada, mas não menos circunspectos, limitando o magistrado à verificação do fumus boni iuris e do periculum in mora.
Pois bem.
No caso vertente o pedido do processo manejado pelo Ministério Público tem por núcleo a condenação do Prefeito Municipal nas sanções previstas para a prática de ato de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, concernentes a legalidade, moralidade, motivação e probidade administrativa.
Para isso, em sede de tutela cautelar, requer a concessão de liminar para afastamento do cargo o Prefeito Municipal responsável pelos atos omissivos que reputa ímprobo, como supedâneo de garantia da instrução processual sem interferência do império do poder que exerce sobre o funcionalismo público, seja através da reiteração dolosa da omissão, seja na intimidação antecedente à colheita da prova testemunhal, trazendo, com isso, a verdade real ao processo de forma intacta.
Dispõe a Lei 8.429/92, parágrafo único:
Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
        Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.
Não há dúvidas, portanto, da possibilidade de afastamento do gestor público, mesmo alçado ao cargo por meio do voto popular, pois decisões desse jaez não ameaçam ou violam o princípio constitucional da separação dos poderes. Ao Poder Judiciário compete o controle da legalidade dos atos praticados pelos outros poderes, função lhe confiada  em um Estado Democrático de Direito.
Assim, para deferimento do pedido de afastamento dois requisitos devem estar sobejamente comprovados: o fumus boni iuris e o periculum in mora.
Segundo Luiz Rodrigues Wambier: "O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a inexorabilidade de sua concessão, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal".
Para o referido autor, "O fumus boni iuris significa a plausibilidade do direito alegado pela parte, isto é, a existência de uma pretensão que é provável, sendo possível ao juiz aferir esse determinado grau de probabilidade pela prova sumária carreada aos autos pelo autor do pedido cautelar".
E "O periculum in mora estará presente sempre que se verificar risco de que a demora do provimento jurisdicional definitivo, que aplicará o direito ao caso concreto submetido ao conhecimento do Poder Judiciário, seja danosa a esse mesmo resultado, na medida em que possa causar dano à efetividade do processo principal. Esse dano à efetividade do processo está ligado a outro dano, de natureza concreta, que pode ser, por exemplo, o perecimento do objeto da controvérsia.
Em conclusão às suas lições, arremata: "Presentes esses dois requisitos, isto é, sendo provável o direito alegado e estando o mesmo sob ameaça, porque não é possível sua preservação até que o Poder Judiciário se pronuncie definitivamente naquele processo, está aberta a possibilidade do manejo da tutela cautelar.".
E esse, pois, é o caso em apreço.
Destaca-se, também, que para a análise do pedido cautelar inaudita altera pars é imprescindível que estejam sobejamente comprovados os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, sustentados, respectivamente, na relevância do fundamento invocado e na possibilidade de ocorrência de prejuízo irreparável ao erário público caso seja a ordem concedida somente ao final, ou após a oitiva previa da parte ex-adversa, pois, apesar da necessidade do contraditório em todo processo, há situações peculiares de urgência que não podem esperar, sob pena de se tornarem inócuas as medidas adotadas.
Assim, para evitar que um provimento tardio torne inútil ou insustentável o direito pleiteado, deve-se analisar o caso concreto para concessão da tutela inaudita altera pars.
E do cotejo dos documentos que instruem o presente feito vimos com clareza solar a existência do fumus boni iuris e periculum in mora para conceder a tutela cautelar de afastamento da função pública, antes da notificação para defesa preliminar.
Saltam aos olhos 02 (dois) processos de cobrança de verbas salariais atrasadas (proc. 492-57.2015.8.10.0116 e 1447-88.2015.8.10.0116) onde se vê, de maneira inconteste, a fumaça do bom direito, pois não obstante a existência de vínculo obrigacional entre o município e seu quadro funcional, assim como a respectiva prestação de serviços à pessoa jurídica de direito público interno, os servidores públicos não vêm recebendo a necessária contrapartida em forma de remuneração, ato que deveria ter praticado de ofício e tal omissão, em tese, caracteriza ato de improbidade que lesionaria os princípios da legalidade, moralidade e probidade administrativa.
A esses dois processos soma-se outro extinto sem resolução de mérito, distribuído nos idos de 2013, onde houve a declaração da perda superveniente do interesse processual em razão da atualização, nos primeiros meses do ano de 2014, dos salários atrasados, demonstrando, pois, com a distribuição das duas ações suso mencionadas, por parte do Ministério Público, e diversas outras em que figuram duplas de servidores no polo ativo, por meio de advogados constituídos, que é plausível o direito invocado para concessão de tutela cautelar, qual seja, de que esteja o gestor, por omissão, cometendo improbidade administrativa, quer por violação a princípios norteadores da administração pública, que por danos ao erário, porquanto, várias das ações resultaram em ressarcimento por danos morais, além do pagamento de salários corrigidos.
No que tange ao periculum in mora não há dúvidas que as reiterações dessas condutas administrativas ao bel-prazer do gestor causam transtornos aos servidores do Município de Nova Olinda do Maranhão/MA, tanto que nos processos principais (para recebimento de verbas salariais) foram concedidas tutelas antecipadas para efetivação de bloqueio de recursos oriundos do FPM, FUNDEB, dentre outros, como garantia do pagamento, o que demonstra que, se se mantiver no cargo de Prefeito, continuará a gerir as verbas públicas à sua conveniência omissiva, embora haja destinação específica em percentuais para pagamento de salário. Isso seria renovar, como ocorreu em 2014/2015, e perpetuar os supostos atos de improbidade administrativa acaso necessário esperar o final do processo para o Poder Judiciário declarar a perda da função pública, em sendo julgado procedente o pedido.
Ressalte-se, também, que quanto ao periculum in mora específico, trazido pelo parágrafo único do art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa, qual seja a de que a medida de afastamento contenha o caráter de imprescindibilidade para instrução processual, os documentos de fls. 290/291 e 295/296 revelam a medida exata da pertinência da tutela cautelar.
Tais documentos evidenciam, em tese, perseguições políticas e/ou punições a ANTONIO DE JESUS RIBEIRO e GEYBSON DE ALMEIDA FERREIRA em razão das notícias levadas ao Ministério Público e pedido de providências, de modo que transferências sem motivação, comunicadas verbalmente, violam o princípio da motivação dos atos administrativos e revelam o desejo pessoal do gestor em detrimento da indispensabilidade dos motivos dos atos discricionários em razão do agir por oportunidade e conveniência do agente público.
Outra noção não pode ter o Poder Judiciário senão a de que tais atos têm sido praticados como meio coercitivo, punitivo dos servidores que denunciaram os fatos e que, inequivocamente, pode contaminar a verdade a ser sedimentada no processo, por meio da instrução, pois inibirá que o servidor colabore com o aclaramento da verdade. Sobre ele possui o Prefeito hierarquia funcional e lhe é consciente o temor da represália se algo restar comprovado e prejudicar o Chefe do Poder Executivo, tanto o é que sentiu in concreto tal efeito com a mera comunicação do fato ao Ministério Público, quiçá, se houver provimento judicial condenatório.
Nesse sentido, vislumbra-se claramente a possibilidade de ocorrência de lesão de difícil reparação, quiçá irreparável, ao direito do Estado em punir atos de improbidade administrativa, se a prova oral vier contaminada pelo vício de vontade da coação.
Importante destacar que outras provas, a exemplo de documentos relativos à destinação das verbas públicas que deveria ser para o pagamento de salários dos servidores públicos, tais como recibos de pagamento de fornecedores, notas de empenho, contratos de obras e/ou serviços, que se encontram em poder do gestor, enquanto guardião-mor dos documentos administrativos da Prefeitura Municipal, se tornaram de difícil obtenção, talvez, perecidas.
Por fim, merece destaque que o afastamento das funções não traduz descontinuidade administrativa municipal, porquanto assume o cargo o sucessor legal, in casu, o vice-prefeito, não trazendo prejuízos aos munícipes, nem aos servidores públicos e muito menos aos serviços essenciais. Ao revés, deve o gestor interino engendrar esforços para atualização dos salários dos servidores, sob pena de cometer atos de improbidade administrativa.
O Superior Tribunal de Justiça##
 , nessa quadra, tem se posicionado:
"(...) O afastamento temporário de prefeito municipal, com base no art. 20, parágrafo único, da Lei n. 8.249/1992 e decorrente de investigação por atos de improbidade administrativa não tem o potencial de, por si, causar grave lesão aos bens jurídicos protegidos pela Lei n. 8.437/1992. Agravo regimental desprovido"
ASSIM SENDO, constatando a presença dos requisitos necessários, consistentes no periculum in mora e fumus boni iuris, e com fundamento no art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/92, DEFIRO o pedido de tutela cautelar para afastar DELMAR BARROS DA SILVEIRA SOBRINHO da função de PREFEITO MUNICIPAL de Nova Olinda do Maranhão/MA, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias##
 , lapso temporal que reputo suficiente à instrução da Ação de Improbidade Administrativa em razão de atos que violam princípios da administração pública e causam dano ao erário, salvo se concluída em menor tempo, sem prejuízo de sua remuneração mensal.
Diante da presente decisão, deverá ainda o requerido manter-se afastado da sede da prefeitura municipal em pelo menos 500m (quinhentos metros), assim como da Secretaria de Educação, Saúde, Administração e Tesouraria, se funcionarem em prédios distintos, sob pena de prisão em flagrante por crime de desobediência, previsto no art. 330 do Código Penal.
Oficie-se ao Comando da 12ª Companhia Independente da Polícia Militar do Maranhão, com sede na cidade de Zé Doca/MA, bem como ao destacamento da cidade de Nova Olinda do Maranhão/MA, para ciência da decisão e atuação imediata em caso de descumprimento, por caracterizar crime previsto no código Penal.
Oficie-se ao Banco do Brasil S/A acerca da presente decisão, dando-lhe ciência do afastamento do requerido do cargo de Prefeito, o que lhe impede de movimentar as contas de titularidade do município de Nova Olinda do Maranhão/MA.
Notifique-se à Câmara Municipal de Nova Olinda do Maranhão, por seu presidente, para que, em sessão extraordinária, dê posse ao vice-prefeito, no cargo de prefeito, como corolário da decisão de afastamento do requerido, no prazo de 24 horas, haja vista a impossibilidade de acefalia do Poder Executivo.
Notifique-se o requerido para apresentar manifestação por escrito, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 17, § 7º da 8.429/92.
Intimem-se o requerido e o Ministério Público da presente decisão.
Cumpra-se.
Santa Luzia do Paruá/MA, 16 de dezembro de 2015.

RODRIGO COSTA NINA
Juiz de Direito

Fonte:MP e TJ Maranhão.


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