Quase 20 anos depois de o governo fechar aquela que foi a maior mina de ouro a céu aberto do mundo, a exploração de Serra Pelada, no Pará, será agora toda mecanizada. A empresa de mineração canadense Colossus Minerals Inc., associada à Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp), conquistou a permissão para explorar a área.
Os primeiros levantamentos feitos em uma parte do terreno de 100 hectares com permissão para ser explorada indicou a presença de, pelo menos, 50 toneladas do metal. Esse número deve ser atualizado pela empresa em janeiro, e a expectativa dos ex-garimpeiros é que o volume seja bem maior, já que a própria mineradora informou que o potencial de novas descobertas na propriedade é elevado.
"É basicamente ouro amarelo, paládio - que é um ouro branco -, prata e platina. Sendo que a incidência menor é de platina, mas, em compensação, o preço é dobrado em relação ao preço do ouro", explicou Antônio Ferreira Milhomem, diretor da cooperativa.
A antiga mina, que na década de 1980, foi alvo da maior corrida a metais preciosos da história da
América Latina, chegou a ser conhecida como "formigueiro humano", com mais de 80 mil garimpeiros trabalhando ao mesmo tempo. O ouro retirado deveria ser vendido exclusivamente à Caixa Econômica Federal. Na época, foram extraídas cerca de 40 toneladas do metal precioso, sem contar o que foi vendido clandestinamente. O grande buraco que os trabalhadores cavaram é hoje um lago com mais de 100 metros de profundidade.
Até a entrada em operação, a multinacional canadense terá investido R$ 320 milhões na construção da mina subterrânea, batizada de Nova Serra Pelada. O lucro, no entanto, será contado em bilhões de reais. Segundo o acordo feito entre a Colossus e a Coomigasp, que levou à criação da Serra Pelada Companhia de Desenvolvimento Mineral (SPCDM), 25% do lucro serão repartidos com os mais de 38 mil ex-garimpeiros da região associados à cooperativa e o restante ficará com a multinacional.
Para esses trabalhadores, que depois do fechamento da mina, há duas décadas, passaram a viver de bicos ou da renda que conseguiram com a venda do ouro, a retomada da produção em grande escala em Serra Pelada é a esperança de uma vida mais tranquila financeiramente. Pouquíssimos conseguiram enriquecer na época e, entre eles, raros souberam investir o que ganharam. Agora, organizados em cooperativa, esperam ganhar o suficiente para viver melhor.
Após 20 anos de espera, ex-garimpeiros esperam que ouro finalmente melhore sua vida
Quando o garimpo de Serra Pelada foi fechado definitivamente pelo governo federal em 1992, milhares de garimpeiros ficaram sem rumo. A maioria voltou para as suas cidades de origem, outros, chamados de "teimosos", continuaram na região, vivendo de bicos ou do que tinham juntado. Todos, porém, com a esperança de um dia se beneficiar do ouro que ainda permanece inexplorado no subsolo. No ano que vem, duas décadas depois, a esperança vai se tornar realidade para quase 40 mil deles que, associados a uma cooperativa de garimpeiros, terão participação de 25% no lucro da mineração que começará.
Alguns garimpeiros ainda não sabem como acessarão a parte a que têm direito. O mais provável é que ações equivalentes a 25% dos lucros do que será extraído sejam repartidas igualmente entre os trabalhadores, mas para isso é necessário que a multinacional apresente o último levantamento do potencial de exploração, o que deve ocorrer em janeiro. A certeza que ninguém esconde, no entanto, é que ainda há muito ouro a ser retirado, e dessa vez sem os riscos que enfrentaram na década de 1980, quando dezenas morreram na mina devido às condições precárias de trabalho
"Hoje, é uma expectativa diferente do passado, mas melhor, porque no passado aqui trabalhavam milhares de garimpeiros, mas quem pegou ouro mesmo, em abundância, não chegou a 0,5%. Mas, atualmente, a lei do cooperativismo diz que são direitos iguais", disse José Sobrinho, de 71 anos, um dos poucos "teimosos" que permaneceram em Serra Pelada.
José Rodrigues, mais conhecido como Bola Sete, 81 anos, diz que cerca de 20 mil ex-garimpeiros já passaram dos 70 anos de idade. O veterano considera que seria melhor se os companheiros pudessem optar por receber sua parte em dinheiro, em vez de ações. "Velho quer o quê? Remédio para colesterol, pressão alta, diabetes, dor nos rins, no fígado, na coluna. O ideal seria a participação nossa em dinheiro. Mas nós vamos acatar porque, na lei do cooperativismo, a maioria decide", disse.
Para Bola Sete, a retomada da exploração de ouro já deu uma nova cara à localidade e pode melhorar a vida de quem ficou. "Temos hoje, aqui dentro, mais de 20 empresas terceirizadas trabalhando para a mina. Temos dez açougues funcionando. Dez!", repetiu entusiasmado.
Outros aspectos da Vila de Serra Pelada, no entanto, que chegou a abrigar 100 mil pessoas (hoje abriga apenas 6 mil moradores), permanecem como antes. Para chegar até lá, é preciso percorrer pelo menos 15 quilômetros de estrada de terra, e não há previsão para a chegada do asfalto. No único posto de gasolina da comunidade, o telhado é de palha e a bomba ainda é movida a manivela, como no início do século passado. As casas também são as mesmas de 20 anos atrás, de tábuas. Na entrada de algumas moradias, ainda estão as velhas placas indicando dormitórios.
Fonte: O Imparcial
Edição: Cícero Ferraz